Postado em 09 de Julho de 2019 às 12h25

Home Care em alta

Gestão de Saúde (33)

Robeson e os pais Nelson e Claudete Sander com a equipe de Serviço de Atenção Domiciliar

Assistência médica domiciliar cresce no Brasil e abrange mais de 670 empresas e 230 mil profissionais

Keli Magri

Há mais de um século, uma cena era comum em pequenas e grandes cidades: o médico da família ou o responsável pela saúde pública local, costumava ir até a casa dos pacientes para prestar atendimento. Diagnóstico, tratamento, prescrição eram feitos longe de um ambiente hospitalar. Porém, com o passar do tempo, a modalidade que existia muito mais por falta de estrutura clínica acabou se tornando hoje uma alternativa para desafogar leitos hospitalares, evitar risco de contaminação e acelerar a recuperação do paciente. Conhecido como Home Care, o modelo regulamentado no Brasil pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) em janeiro de 2006 e redefinido em abril de 2016 pela Portaria 825 do Ministério da Saúde, oferece estrutura completa para atendimento médico domiciliar e tem crescido de forma exponencial no país nos últimos anos.

De acordo com a Federação Brasileira de Hospitais (FBH), em 2012, segundo levantamento da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe), encomendada pelo Núcleo Nacional das Empresas de Serviço de Atenção Domiciliar (Nead), apenas 18 empresas atuavam no mercado. Hoje, são 676 que empregam 230 mil profissionais em toda rede de serviços do setor.

A relevância tem respaldo. A categoria Home Care é uma extensão do atendimento hospitalar, podendo ser ambulatorial, maioria dos casos, e de internação. Mediante indicação médica e de acordo com a patologia, o paciente passa a ter atendimento domiciliar com o médico especialista, técnicos em enfermagem e enfermeiros, munidos de equipamentos adaptados e medicação. Por se tratar de assistência médica fora do ambiente hospitalar, o modelo acaba sendo uma alternativa à sobrecarga ou à ausência de leitos nos hospitais. De acordo com levantamento da Fipe, a interrupção dos serviços de Home Care hoje, no Brasil, obrigaria a criação de 16 mil novos leitos hospitalares, o que equivale a todos os leitos do estado de Santa Catarina, por exemplo.

Necessidade vira negócio

Um problema de saúde da sogra que acabou revelando a falta de atendimento médico domiciliar capacitado, fez com que o administrador Carlos Alberto Refosco abrisse uma empresa de Home Care. Com 17 anos de experiência como servidor público na área de saúde e especialização em administração hospitalar, Carlos responde pela única empresa que presta os serviços há dois anos em toda a região metropolitana de Chapecó, maior cidade do Oeste de Santa Catarina. Hoje, são 20 pacientes atendidos e mais de 20 profissionais em atuação. Para ele, é notório o crescimento do setor no país.

“Eu senti a necessidade enquanto paciente, mas hoje as próprias instituições de saúde têm investido na modalidade porque ela é mais barata que a internação hospitalar. Ela chega a reduzir até 50% dos leitos no atendimento ambulatorial, 40% na média complexidade e 20% na alta complexidade. Além disso, reduz e elimina o risco de contaminação hospitalar, que hoje alcança 70%, e oferece uma recuperação mais rápida ao paciente com um tratamento mais humano, dentro de casa e perto da família”.

Na empresa dele, a maior parte dos atendimentos é ambulatorial, com pacientes que se recuperam de Acidentes Vasculares Cerebrais (AVC), sob os cuidados médicos de fisioterapeutas, fonoaudiólogos e nutricionistas, em plantões de 8h, 12h e 24h.

“Para o atendimento domiciliar, primeiro é feita visita ao hospital pela nossa equipe técnica para saber a real situação do paciente. Depois, na residência dele para ver se o local é insalubre ou não, se tem todos os elementos para instalação dos equipamentos, se o paciente estará adequadamente e confortavelmente colocado. Com o diagnóstico, se inicia o tratamento, com a frequência de visitas prescrita pelo médico especialista e horários de atendimento definidos pela família, além de relatórios de evolução preenchidos pelo médico e pelos técnicos dos plantões”, detalha Carlos, ao enfatizar a importância do trabalho na outra ponta dos serviços.

“Durante todo o tempo, o paciente também está sob atenção do seu cuidador. Pode ser um familiar ou uma pessoa contratada para isso. Os cuidadores são a nossa ponte e, ao mesmo tempo, simbolizam a essência dos serviços de Home Care: a proximidade, a humanização, a familiaridade”.

Família transforma tratamento

É justamente estes três pontos citados por Carlos que transformaram a rotina da família Sander, em Chapecó. Depois de um acidente de moto em janeiro do ano passado, o filho Robeson Sander, 35, sofreu traumatismo craniano grave, ficou quase dois meses em coma e 68 dias hospitalizado antes de ser transferido do leito hospitalar para o atendimento público domiciliar. Entre 17 de janeiro a 14 de dezembro de 2018, passou a receber tratamento em casa, sob os cuidados da equipe médica multidisciplinar e dos cuidadores Nelson e Claudete, seus pais de 68 e 60 anos, respectivamente.

“Ele nem abria os olhos. Não falava, nem se mexia. A gente achava que não ia dar conta”, lembra a mãe, emocionada ao relatar o esforço da família para adaptar o quarto para o tratamento e passar por capacitação feita pela equipe do Serviço de Atenção Domiciliar – Programa Saúde em Casa do município. Foram seis meses com atendimentos semanais de nutricionista, psicólogo, fonoaudiólogo, fisioterapeuta, médico e equipe de enfermagem formada por mais cinco profissionais.

A rotina dos pais mudou completamente. Começava às 5h e só terminava à meia-noite. Claudete e Nelson aprenderam a usar a sonda para alimentação de Robeson que precisava ser de três em três horas, sete vezes ao dia, a medicar de forma correta e a estimular pequenos exercícios para a recuperação do filho. Em seis meses, viram os primeiros resultados.

“Ele falou pela primeira vez. Chamou pela filha, Júlia, e depois foi progredindo, recuperando a voz, abrindo os olhos, mexendo as mãos, os pés”, conta o pai, orgulhoso do filho que já não tem muitos problemas na fala e consegue dar os primeiros passos com a ajuda do andador. Apesar de ter recebido alta do atendimento domiciliar há sete meses, Robeson continua com as sessões de fisioterapia em uma clínica três vezes por semana.

“A gente achou que não iria conseguir, mas aprendemos muito e hoje percebemos que essa foi a melhor forma de tratar nosso filho”, sublinha dona Claudete.

“A dedicação, os cuidados e o comprometimento deles foram exemplares. Nelson e Claudete seguiram à risca todos os cuidados e neste quase um ano de atendimento domiciliar, Robeson não teve feridas e só voltou uma vez para o hospital, devido à uma convulsão. Todo o resto do tratamento foi em casa”, relata a médica da equipe, Carolina Volkmann.

“O serviço Home Care busca a desospitalização, a assistência médica de qualidade no domicílio para evitar que o paciente retorne ao hospital, visando a reabilitação e a capacitação dos cuidadores”, acrescenta a coordenadora do programa em Chapecó, enfermeira Diana Augusta Tres.

De olho nos 43 milhões de habitantes que têm algum tipo de plano de saúde no Brasil, potenciais usuários do sistema de atenção domiciliar, a Federação Brasileira de Hospitais (FBH) reverbera a expectativa de crescimento contínuo do setor nos próximos anos.

Home Care e os resíduos

O que muitas pessoas talvez não saibam é que os resíduos de saúde devem ser descartados de forma correta para não causarem problemas sociais e ambientais, que vão desde a intoxicação acidental de crianças e adultos até o impacto na qualidade da água e na saúde pública.

No caso dos serviços de Home Care, os resíduos gerados devem ser recolhidos diretamente dos domicílios por empresas especializadas, com certificações específicas da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) e de órgãos ambientais. A Servioeste, especialista em coleta, transporte, tratamento e destinação final dos resíduos de saúde em todo o Sul e Sudeste do país, também recolhe em domicílios atendidos pela modalidade.

De acordo com a engenheira ambiental da empresa, Caroline Beutler, os resíduos de Home Care coletados podem ser infectantes (descartes de vacinas, gases, luvas, curativos), químicos (medicamentos vencidos ou sobras) e perfurocortantes (lâminas, agulhas, ampolas de vidro). Para cada um, existe uma destinação correta, regulamentada pela RDC 222 da Anvisa, de 28 de março de 2018.

“Assim como o resíduo gerado dentro de um ambiente hospitalar ou de uma unidade de saúde básica, os gerados em atendimento Home Care também são resíduos de saúde, com algum tipo de contaminação, biológica ou química. Por isso, tanto o profissional que faz o atendimento, o paciente que o recebe e a empresa que oferece a modalidade, são responsáveis por esses resíduos e devem saber que eles precisam ser encaminhados para tratamento e disposição final adequados. No caso das substâncias infectantes e resíduos perfurocortantes, em geral, são encaminhados para o tratamento por autoclavagem, que é a esterilização, enquanto os resíduos químicos vão para a incineração. Ambos, após o tratamento, são dispostos em aterros sanitários”.

Desde o ano passado, a Servioeste também atua na logística reversa de medicamentos, disponibilizando totens às unidades de saúde para o recolhimento de remédios, tratamento e destinação final. Todo e qualquer medicamento vencido ou sobra dele deve ser descartado nestas unidades e não pode ser jogado no mesmo local do resíduo comum ou do reciclável.

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